Jornal Pessoal
A AGENDA AMAZÔNICA DE LÚCIO FLÁVIO PINTO
http://www.lucioflaviopinto.com.br/?p=622
A poluição tecnobrega
Já houve criação humana mais horrorosa em matéria de música do que o
tecnobrega? Eu não conheço. A rigor, esse gênero nem pode ser enquadrado
na condição de música. Não tem harmonia nem melodia. O ritmo é tão
pobre quanto o de um bate-estaca. Uma voz esganiçada geme como se
tivesse dado uma topada. Uma voz eletrônica interrompe o - digamos assim
- cantante para anunciar qualquer coisa. Ao fundo, um ruído eletrônico
remete o ouvinte à cacofonia do inferno. Quem submete seu ouvido a essa
monocórdia repetição de um cantochão primal jamais virá a saber o que é
música.
Servir de cenário para o surgimento dessa monstruosidade antimusical
não consagra de vez o Pará como a terra do barulho e Belém como a sua
lídima capital? De fato, o paraense tem uma propensão natural para ouvir
música, cantar e dançar. A vertente verdadeiramente musical dessa
tradição fecundou compositores, músicos e cantores em atividade como
Nilson Chaves, Vital Lima, Alcyr Guimarães, Sebastião Tapajós, Nego
Nelson, Fafá de Belém, Leila Pinheiro, Jane Duboc, Andréa Pinheiro e
muitos outros.
Mas outra vertente foi progressivamente empobrecendo uma matriz que
já era limitada. A música paraense de raiz é monótona, repetitiva,
dominada pela marcação do ritmo, que cada vez mais sufoca as outras
partes (mais relevantes) da composição. Ouve-se com deleite três números
de carimbó. A partir daí, a exaustão vem rápido. Um disco inteiro de
carimbó demarca na audição a exigência de quem ouve. Uma festa só de
brega é passaporte para o rebaixamento do gosto. Uma única música de
tecnnobrega é tortura auditiva. Com o som estourando o registro dos
decibéis, é poluição humana certa.
A cidade é tomada todos os dias e inundada nos fins de semana por
essa agressão de barulho, que também dá sua contribuição à violência
geral. Contando, para a consumação do crime, com o disfarce da cultura
popular. A tolerância geral para esse tipo de maneirismo não minimiza a
gravidade da agressão. Só a torna menos perceptível. E, justamente por
isso, mais letal. Corrói aos poucos, aniquila a sensibilidade, deforma o
gosto.
LFP @ janeiro 15, 2009
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